Ficha biográfica
Nome completo: José Sobral de Almada Negreiros. Nasceu em: Trindade, São Tomé e Príncipe, 7 de abril de 1893. Morreu em: Lisboa, 15 de junho de 1970.
Almada Negreiros nunca andou numa escola de artes. Aprendeu tudo sozinho e quase tudo experimentou. Da pintura ao desenho, da cerâmica ao vitral, do teatro ao bailado, da novela gráfica à poesia. Deve ter tido, certamente, medo em aventurar-se por territórios desconhecidos. Ninguém é tão cheio de si ao ponto de não sentir, ao menos, uma pontinha de insegurança. Ainda assim, arriscou. Mesmo que o criticassem na praça pública, mesmo que se rissem da figura intempestiva que muitas vezes fazia ou das bojardas que lançava para agitar as águas.
Almada não era pessoa de apreciar a pasmaceira, esperando que o dia seguinte fosse igual ao anterior. Ficar pelo que já nos é familiar é sempre mais cómodo. Não há surpresas, a vida corre sem sobressaltos, mas, ao final do dia, o que é que fica para guardar? Este homem achava que todo o tempo do mundo era ainda pouco para ficar parado a fazer as mesmas coisas. Era um modernista – dizem os estudiosos das correntes artísticas – por querer romper com os velhos costumes.
Mas não era deitar abaixo só porque sim. O passado não é um bocado de papel amarrotado que se atira para o lixo. Sem a História somos náufragos à deriva no mar-alto. Mas, a tradição também não pode ser um pretexto muito conveniente para quem não quer sair do seu castelo e avançar para novos ciclos seja na arte, no pensamento, na política ou na ciência. Almada não gostava dos homens instalados nos seus poderes. Esses estão sempre bem. Nunca querem mudar e a tudo estão dispostos para que nada mude. Não é fácil tirá-los dos seus pedestais porque eles só ouvem o que querem ouvir.
Para fazer tremer o reinado dos acomodados, é preciso falar mais alto e, em casos extremos, usar o humor, o escárnio e a sátira para tirá-los do sério. Almada Negreiros fazia isso com mestria e descaramento, mas não era propriamente uma técnica desconhecida no mundo das artes. Já antes dele, no final do século 19, Eça de Queiroz – outro grande insatisfeito – usava os seus romances para ridicularizar figuras presunçosas, de mentalidades conservadoras e paradas no tempo.
Almada Negreiros escreveu-o quando tinha 23 anos, usando a artilharia toda de insultos, sarcasmos e desdém contra o pobre do Dantas. Ao ser publicado em março de 1915, explodiu como uma granada a estilhaçar o bom nome das elites portuguesas.
Almada foi um artista com um dom para muitas artes, mas também para tirar da escuridão o lado sombrio dos portugueses. É natural que muitos o detestassem. É bem provável até que, se estivesse hoje por aqui, incomodasse mais gente ainda. Mas nem era isso que ele pretendia. Lutar contra os que não avançam nem deixam avançar, essa é a missão dos homens e das mulheres que, como ele, vêm do futuro para sobressaltar os nossos dias.
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